terça-feira, 25 de setembro de 2012

1.1 - A IGREJA CATÓLICA APOSTÓLICA ROMANA



Esse texto faz parte da obra inédita, em vias de ser publicada, denominada "As terras do Divino Espírito Santo - História de fé e luta de um povo", Volume I, de minha autoria. O texto seguinte faz parte de seu 1º capítulo.

A IGREJA CATÓLICA APOSTÓLICA ROMANA
Murah Rannier Peixoto Vaz
 
Simbolicamente, pode-se afirmar que a Igreja é como uma flor. Desejada pelo Pai, plantada pelo Filho, nutrida pelo Espírito Santo e cultivada pelos apóstolos. Essa flor é formada por diversas pétalas, unidas em um mesmo pendão, estabelecidas sob um mesmo caule, alicerçadas nas mesmas raízes. Cada pétala que se afasta das demais, leva consigo o seu brilho e parte da beleza da flor, que acaba ferida e desfigurada, mas continua viva, pois suas raízes e seu caule permanecem lhe fornecendo aquilo que é próprio da semente plantada. O mesmo não se pode dizer das pétalas separadas. Muitas não sobrevivem, as demais ficam privadas daquilo que lhe é próprio e acabam se alicerçando sob outras raízes. Cada um que se afasta não destrói a Igreja, mas deixa vazio o lugar que devia preencher nas paredes desse edifício espiritual que é a Igreja e, o qual, ninguém ocupará se o próprio não o ocupar.

Qual compreensão de si mesma tem a Igreja? De modo sintético, é isso o que esse texto abordará. A Igreja possui notas, ou seja, características próprias que lhe garantem ser a Igreja de Cristo. Essas quatro notas foram definidas, no ano de 381, no “Credo” Niceno-Constantinopolitano, estabelecido nos Concílios de Constantinopla e Nicéia, porém, já eram correntes. Encontradas anteriormente no “Credo” de Santo Epifânio e no de São Cirilo de Jerusalém (MYSTERIUM SALUTIS, 1975, p. 5).

De tal modo, a Igreja é Una por sua fonte, o Deus Uno e Trino, por vontade expressa de seu fundador, Jesus Cristo (Cf. Jo 17,21), que nos une com Deus, por meio do Espírito Santo de amor, alma da Igreja, que realiza a comunhão dos fiéis. Conclui-se que, ainda que formada pelos diversos membros, a Igreja forma um só corpo em harmonia, cuja cabeça é o Cristo. Essa unidade se dá internamente (em três aspectos: fé, sacramentos e comunhão hierárquica) e externamente (geograficamente e antropologicamente, ou seja, a totalidade dos homens, santos e pecadores, a caminho), já nos primórdios da Igreja ela aparece com ênfase e destaque: “A multidão dos fiéis era um só coração e uma só alma” (Cf. At 4, 32); A Igreja é Santa porque instituída por Jesus Cristo, aquele que é três vezes santo. N’Ele a Igreja é enxertada, tornando-se os membros de Seu corpo, e por Ele é constantemente nutrida pela Graça divina que a santifica e a faz sempre nova. Como nova vinha que substituiu a antiga[1] (Cf. Is 5,1-7; Mt 21,33-46), “seu crescimento não é fácil, ela é maltratada por repentinas fases de seca, de geada e de dolorosas podas, mas não podem faltar os frutos nos sarmentos inseridos na videira fundamental”[2]. Consequentemente, a Igreja vai além de uma mera instituição humana e realiza-se por obra do Espírito Santo. Quanto à essa santidade diz o Catecismo da Igreja Católica:

A Igreja é santa, mesmo tendo pecadores em seu seio, pois não possui outra vida senão a da graça: é vivendo de sua vida que seus membros se santificam; é subtraindo-se à vida dela que caem nos pecados e nas desordens que impedem a irradiação da santidade dela. É por isso que ela sofre e faz penitência por essas faltas, das quais tem o poder de curar seus filhos, pelo sangue de Cristo e pelo poder do Espírito Santo (CEC 827).

A Igreja é Católica porque possui um chamado universal, no sentido de integralidade e de totalidade (CEC 830). Ela é aberta a todos os povos, culturas e nações (Cf. At 2, 4), e, por isso, é chamada de Sacramento Universal da Salvação. Todo aquele que se salva se salva por meio dela[3]. Por isso, ela é chamada a se estender até os confins da terra; a “Igreja é Apostólica por ser fundada sobre os Apóstolos...” (CEC 857). A Igreja, cuja edificação permanece sob o alicerce dos apóstolos presididos por Pedro, continua a conservar e transmitir, com a orientação do Espírito Santo, o ensinamento de Cristo e de seus Apóstolos. Estes sucessivamente, por concessão do Romano Pontífice (Cf. At 1,15-26), transmitem o mandato de Cristo a novos Apóstolos (Colégio dos Bispos) e são presididos por Pedro, na pessoa do atual Papa[4], o Bispo de Roma, que possui uma sucessão direta do Apóstolo Pedro. Desse modo, a Igreja, “continua a ser ensinada, santificada e dirigida pelos Apóstolos até a vinda de Cristo, graças aos que a eles sucedem na missão pastoral” (CEC 857).

A fundação da Igreja é de direito divino, pois foi fundada por Jesus Cristo, Deus que se fez homem. Assim, “a Igreja é humana porque Jesus é humano, ela é divina porque Jesus é divino” (SUGAI, 1996, p. 88). Portanto, Deus se fez homem para estar mais próximo dos homens. Ao assumir totalmente a condição humana restaurou a humanidade corrompida pelo pecado original e, mais do que isso, elevou-a a uma condição superior a anterior à queda. Dentro de seu plano de salvação, Jesus fundou a Igreja e a fez humana e divina. Desse modo, a hierarquia apostólica se fundamenta na vontade e no direito divino de Cristo. No início de seu ministério Jesus chamou doze para viverem em comunhão consigo e para estarem mais próximos de si, instituindo o Colégio Apostólico (Cf. Mc 3, 13-19; Lc 6, 13-16). De modo diverso, foram chamados outros setenta e dois discípulos (Cf. Lc 10, 1). Dentre o grupo dos doze, Cristo escolheu Simão, a quem chamou de Pedro (Cf. Mt 16, 18-19) e o pôs à frente de seu Colégio Apostólico. Sobre a mudança de um nome na Bíblia, Bourke faz a seguinte afirmação: “No pensamento semítico, o nome designava o que a pessoa era, e o recebimento de um novo nome indicava alguma mudança na pessoa que o recebia[5]” (2011, p. 694).

Pedro recebeu de Cristo o ofício de ser o pastor de um só povo e um só rebanho, apascentando e confirmando os irmãos na fé (Cf. Jo 21, 15 ss; Lc 22, 32)[6]. Cristo é o Pastor, a rocha, pedra angular rejeitada, mas transmite a Pedro a autoridade que o Pai lhe concedeu. A sucessão apostólica, por meio da contínua transmissão do múnus petrino de confirmar os irmãos na fé e a autoridade de ligar e desligar dada por Cristo (Cf. Mt 16,18-20), garante que a Igreja subsista através dos tempos, conforme a vontade de seu divino fundador, que prometeu permanecer conosco até o fim dos tempos (Cf. Mt 28,20). A missão dos Apóstolos é a missão de Cristo. Não por mérito pessoal, mas, “pela participação na graça de Cristo, os Apóstolos prolongam na história, até a consumação dos tempos, a mesma missão de salvação de Jesus em favor dos homens” (PDV, 2005, p. 39). Isso ocorre como continuidade do “corpo místico de Cristo” de onde recebemos todos os seus méritos:

Não existe salvação sem a Igreja. Todos os homens podem ser salvos pela Igreja, ou na Igreja. Através da Igreja quando, desconhecendo a Igreja, vivem de acordo com a retidão de suas consciências; na Igreja quando, conhecendo a Igreja, buscam as graças de salvação deixadas na Igreja por Jesus Cristo (SUGAI, 1996, p. 88).

 

Desde os primórdios do cristianismo, a Igreja de Roma presidia as demais na caridade. Em nenhum outro lugar do mundo foram mortos tantos cristãos. Além de todos os outros cristãos, foi ali que Pedro e Paulo, as colunas da Igreja, levaram a termo a sua fé, sendo martirizados. Em Roma está o túmulo de Pedro, que foi crucificado como seu divino mestre. Em Roma foi plantada a pedra sob a qual Cristo fundou sua Igreja. Nessa cidade foi eleito Lino, o primeiro sucessor de Pedro. Por esses motivos, permanece em Roma a Cátedra de Pedro.

Resumindo o que é a Igreja, podemos dizer como Bruno Forte: “A Igreja provém da Trindade, é estruturada à imagem da Trindade e ruma para o acabamento Trinitário da história” (2005, p. 9). Ou seja, “vinda do alto (oriens ex alto), plasmada pelo alto  e rumo ao alto (“Regnum Dei praesens in mistério”, LG 3), a Igreja não se reduz às coordenadas da história, do visível e do disponível” (FORTE, 2005, p. 9). Finalizando, podemos dizer que a Igreja surgiu do mistério divino, caminha como mistério na Igreja, Sacramento da comunhão dos homens, com seu divino fundador, para alcançar seu destino: a consumação escatológica.

Por tudo isso, acreditar na Igreja Católica significa crer no projeto de salvação para a humanidade, estabelecido pela própria Trindade; acreditar na Igreja significa confiar em Jesus Cristo e em sua promessa de que enviaria o Espírito Santo que a manteria na Verdade e regeria essa instituição, fundada por Cristo e jamais desamparada (Cf. Jo 16, 12-13), para levá-la ao encontro do Pai.




[1] A vinha é símbolo do povo de Israel (Jer 2, 21), Deus promete uma nova vinha (Is 27, 2-6).
[2] Missal Dominal, São Paulo: Paulus, 1995, p. 415.
[3] Mesmo aqueles que não estejam em plena comunhão com a mesma, mas vivam a unidade pelo batismo e pela Palavra, pois o Espírito Santo sopra como lhe apraz, ele não se limita às fronteiras da Igreja, todavia, a Igreja foi o meio, isto é, o instrumento concreto e seguro que o Senhor nos deixou para nossa salvação.
[4] Bento XVI é o 266º Papa e o 265º sucessor de Pedro.
[5] O mesmo aconteceu com outros personagens bíblicos bem conhecidos, entre eles: Abrão – Abraão e Oséias – Josué
[6] O Bispo de Roma sucede a Pedro nominalmente e os Bispos, por ele legitimamente aprovados, sucedem aos Apóstolos colegialmente.