sexta-feira, 23 de setembro de 2011

A CHARIS – A GRAÇA DE DEUS

Murah Rannier Peixoto Vaz

A graça é uma participação na vida divina (CEC 1097), que nos introduz na intimidade da vida Trinitária. Desponta em dois sentidos: o natural e o sobrenatural. A graça santificante é uma realidade rica e complexa. Através da graça concedida pelos méritos de Cristo e não do próprio homem, o homem é santificado, renovado interiormente e justificado de seus pecados. A graça infunde a fé, a esperança e a caridade, meios necessários para a disposição do homem a ser justificado. Como a graça é uma categoria relacional onde é gerada a comunhão, como um movimento contínuo, quando há ruptura na relação rompe-se com a graça e fecha-se a ela, pois permanecer na graça é permanecer na relação com Deus, em Jesus Cristo, por meio do Espírito.

Percorrer-se-á o sentido sobrenatural encontrado nas cartas católicas e paulinas:

A graça é dada por Deus aos humildes; é multiforme em dons e carismas; produz constância e firmeza naquele que a recebe e de modo algum pode ser banalizada. É dada pela revelação por Jesus; o conhecer Jesus concede graça e paz; porém, é preciso crescer na graça, pois o próprio Jesus crescia em graça e estatura.

Graça e salvação – É preciso colocar a graça recebida ao serviço dos outros, pois a graça é um Dom, dado livremente, que para continuar a ser dom deve ser dado livremente. A graça dada é algo definitivo, irrevogável da salvação, da redenção, da justificação; que se torna transformação em Cristo.

Nas cartas paulinas encontra-se constantemente a menção à desproporção da graça divina frente a nossos méritos, ela é infinitamente maior e vai além de tudo o que se possa pedir e conceber. Por isso somos justificados pela graça e não pelas obras, ainda que as obras sejam sinal de que a graça opera em nós.

Graça e sofrimento – é graça suportar as dificuldades e aflições, sofrer injustamente. Isso constitui ação louvável, sofrer o máximo pela mínima culpa, unindo-se ao exemplo do Cristo. A graça não vem do próprio homem, mas é algo externo e o capacita para a doação de si, oblativamente e altruisticamente. É a graça quem concede sofrer por Cristo, uma graça que não pressupõe renunciar a si mesmo não é graça, pois a maior graça é conhecer Jesus, ele é a própria graça, que convida a deixar tudo e segui-lo, achando isso um grande lucro e tomando por esterco o que é deixado. Assim, a graça também é tida como a vida eterna, unido a Cristo.

Como visto, as obras permanecem necessárias, mas são resposta à graça concedida anteriormente. De tal modo, é a graça quem prepara as obras, fazemos o bem porque o Pai é bom e sem a graça as obras jamais seriam meritórias.

A graça pode ser dividida ainda em graça incriada e graça criada. Graça incriada é o próprio Deus uno e trino, já a graça criada são as mais diversas formas da graça multiforme criada e dada por Deus. Por isso, a graça criada é um dom produzido por Deus, do qual não podemos produzir, pois não é fruto de nossos esforços, nem de nossa natureza.

Também pode se dividir a graça santificante em dom habitual e atual:

1 - A GRAÇA, UM DOM HABITUAL – Enquanto dom habitual é “uma disposição estável e sobrenatural para aperfeiçoar a própria alma a viver com Deus (CEC 2000)” e agir por seu amor. É recebida no batismo e aumentada na participação e recepção dos demais sacramentos. É uma qualidade inerente e infusa na alma, ela eleva, ou seja, restaura a imagem e semelhança de Deus no homem e o eleva da condição de criatura à altíssima condição de filho de Deus; ela também sana: sara a natureza corrompida e cura as feridas do pecado, para que o homem possa realizar obras merecedoras de vida eterna.

Hábito: 1) Entitativo – age sobre o ser, sobre a alma.

2) Operativo – virtudes e dons.

Essa graça é perdida pelo pecado mortal, mas pode ser reparada através do sacramento da penitência e também pela unção dos enfermos, ou extrema unção.

2 - A GRAÇA, UM DOM ATUAL – A graça atual são “as intervenções divinas, quer na origem da conversão, quer no decorrer da obra de santificação (CEC 2000)”. É uma ajuda sobrenatural de Deus, pela qual o homem se faz apto a agir como se convém para obter a vida eterna. Não ocorre apenas externamente, mas internamente e por ela Deus age em nós, ainda que nem tudo se faça somente pela graça.

A graça atual pode ser concedida de diversos modos, por uma iluminação do entendimento, por inspiração da própria vontade. Também pela graça elevante que auxilia o homem a agir com a prática de boas obras, a graça medicinal ajuda a conhecer a verdade e agir segundo a verdade e para evitar e rejeitar o pecado. A graça atual ainda desencadeia no homem o próprio desejo da graça e da salvação e o dispõe a iniciar-se na fé e nela perseverar.

Uma das características da graça atual é que ela é transitória. Isto é, serve para “aquele momento”, é específica. Depois daquela, pode vir outra, mas ela passou e o homem pode tê-la acolhido ou não, mediante a sua abertura.

A graça não é uma imposição onipotente de Deus a qual não se pode resistir, mas na verdade é um auxílio que pede a cooperação e a disponibilidade do homem. O homem é chamado a cooperar livremente com a graça, que, no caso da não aceitação, pode ser rejeitada, mas quem sai perdendo é o próprio homem.

A graça atual está sempre em vista da graça sobrenatural santificante. Pode ocorrer também em alguém fora da graça santificante e dessa forma pode conduzir a ela.

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